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À conversa na oficina de Marcelino Correia, afinador de acordeões e concertinas

Associação PédeXumbo (Atualizado em: 31 Agosto, 2022 )

Marcelino Correia é um amante de acordeões desde que se conhece e “autodidata da música”, como gosta de se chamar. Natural de Cabeção, foi para Lisboa muito novo perseguir o seu sonho de aprender acordeão e, não só conseguiu, como se tornou um afinador especialista deste instrumento.

Hoje, regressou à sua terra – Cabeção -, mas mantém a paixão e o oficio, tendo construído a sua própria oficina, onde agora o encontramos, sempre que lá levamos os acordeões e concertinas da Bolsa de Instrumentos PX para serem afinados. Nunca podemos de lá sair sem ouvir música, cantar e sem uma boa conversa.

Joana (PédeXumbo): Como se intitula, é afinador?

Marcelino Correia: Sou afinador de acordeões e pianos. Fui para Lisboa muito novo e fiz sempre a minha vida em Lisboa. Abalei daqui com 17 anos, mas nunca perdi a ligação à minha terra (Cabeção). Andei sempre lá aqueles anos todos e regressei agora há 5 anos. Quando me reformei vim para aqui e já tinha em mente fazer a esta oficina. Lá já trabalhava. Trabalhei 35 anos na Casa Matono, que era o Instituto Musical Matono, onde iam os grandes acordeonistas, o Tino Costa, o Fernando Ribeiro, o Anibal Freire, que foi campeão do mundo, tantos, aquela malta toda dos acordeões. E depois pensei “ah, se eu sei trabalhar para os outros, também sei trabalhar para mim”. Fui comprando um acordeãozinho assim e depois outro e depois trocava e aquela coisa…e até gosto muito! Eu sou afinador, não sou vendedor, mas a gente não pode ficar com eles todos. E eu quando, por qualquer coisa, às vezes, vendo um acordeão epá fico… – não gosto, está a perceber? – parece que é um bocadinho de mim que se está a ir embora! Está a ver aquele que está ali, antigo, assim género madeira que tem lá umas bonequinhas? Aquilo é uma relíquia, aquilo não tem valor para muita gente, mas para mim tem muito valor!

J.: E regressou para o alentejo porquê?

M.C.: Porquê? Para vir passar aqui o resto dos meus dias!

J.: E agora afina aqui, para músicos daqui?

M.C.: Sim, e depois sou muito conhecido! Também toco em ranchos, grupos, também canto! Eu sou um autodidata da música (risos). Toco em Pavia com um amigo meu, que é aqui o Sertório, que é muito conhecido, o grande acordeonista de Mora. A gente normalmente tem sempre dois acordeonistas. Toco com ele em Pavia e toco com ele nas Brotas. Faz tudo parte aqui do concelho de Mora. Cá em Cabeção toco num grupo! Cabeção tem um grupo e tem um rancho. No grupo toco com um rapaz que costuma estar aqui e que me ajuda. Também está reformado e vem para aqui, eu ensino-lhe e ele vai fazendo. E canto no rancho de cá (risos).

J.: E como é que aprendeu a tocar e depois a afinar? 

M.C.: Foi no Matono! O meu pai já tocava, tinha já acordeão, porque eu nasci num monte e enquanto cá estive, até vir para a vila, era assim nos montinhos aqui à volta. O meu era o que se chamava um moiral das parelhas, trabalhava com mulas e eu ainda andei a trabalhar com ele. As parelhas chamava-se por exemplo mulas ou machos, eram por exemplo 4 ou 5 ou 6, e ele era a pessoa que distribuia o trabalho pelos outros. 

J.: E foi o seu pai que lhe ensinou a tocar acordeão?

M.C.: O meu pai não me ensinou, o meu pai sabia muito pouquechinho. Eu fiz o exame da 4ª classe aqui em Pavia e logo assim que saí da escola ia ouvir os bailes, aquelas pessoas que na altura eram boas, e dizia assim “Eu tenho que ser como estes gajos”. Quando vinha dos bailes, chegava a casa e dizia ao pai “Então e aqui como é que se faz?” e ele respondia “Olha elas estão lá, experimenta”.  Elas estão lá eram as vozes, as notas, que ele não sabia mencionar nomes, porque ele tocava de ouvido. Ele não sabia se era um ré, um fá, um mi, não sabia! Depois quando fui para Lisboa, pronto! Abriram-me as portas…comecei a estudar! Mas eu já sabia um bocadinho, está a perceber? E eu muitas vezes continuo a tocar de ouvido, porque parece que me sai melhor, como sei cantar também…Isto a gente estar a tocar é como se estivéssemos a cantar com os dedos, não é? 

J.: E a arte de afinar como aprendeu?

M.C.: A arte de afinar foi no Matono que eu aprendi. O Vitorino Matono, que faleceu agora há pouco tempo, era o meu ídolo de criança porque era um exímio acordeonista aqui da freguesia de Alcórrego, aqui ao pé de Avis. Ele era daqui e o meu pai era muito amigo dele. Eu queria era ser acordeonista, mas também tive sempre aquele coisa de ser um mecânico, gostava era de ter sido mecânico de automóveis, mas não era possível para os meus pais…a gente tinha que ir trabalhar, não é? Depois fui para a tropa e quando regressei tinha um acordeão assim já velho que levei lá ao Matono para mo arranjarem. Mas eles não tinham tempo de mo arranjar. Como eu morava no prédio da oficina uma vez disse lá ao afinador, que era o Fernando “Epá você não tem tempo e tal…” e ele disse “Então, mas eu vou falar com o Amarilis” – o Amarilis era o filho do patrão, que era um exímio acordeonista – “e eu vou-lhe dizendo como é que você faz”. Eu morava no prédio e quando vinha do trabalho chegava lá e ele dizia-me “Olhe agora faça assim, faça assado” e quando o acabei de arranjar ele volta-se pra mim e diz assim “Epá você até parece que já sabia afinar…!”. E nem a propósito, precisavam lá de um afinador, fui logo para lá como afinador!! A partir daí foi o fogo! Muitas vezes o Sr. Matono e o Amarilis diziam – eu nem gostava que eles dissessem aquilo – “Isto é do melhor que há cá no país”! Não sabia lidar com os elogios, cheguei ali ao ponto máximo. Depois aprendi música, claro! Uma pessoa para andar nisto tem que saber, tem que conhecer isto tudo. Isto aqui tudo tem um nome e há acordes maiores, menores, sétimas, tá tá tá. Por mim pode aparecer aqui um acordeão todo aos bocadinhos que eu arranjo.

J.: E agora continua a sua paixão aqui em Cabeção?

M.C.:  Sim, claro! A pessoa quando nasce para a coisa…eu nasci para isto, como diz o outro “nasci para a música” e é verdade! Eu sinto-me bem é nisto ainda! Eu podia estar saturado, nem querer saber disto, mas felizmente tenho uma vida estável.

J.: O Sr. Marcelino é daquelas pessoas que pode dizer que teve a sorte de fazer na vida o que queria ter feito , aquilo que nasceu para fazer.

M.C.: Sim, sim, sim. E ainda hoje nós estamos a aprender, porque nem todos os instrumentos vêm iguais! Este traz uma coisa, aquele traz outra, um é de uma marca, o outro é de outra. A gente tem que estar sempre a inventar. Se um tipo estiver bem preparado, resolve! Aparece aqui com cada coisa…que até parece mentira.

Tudo sobre a Bolsa de Instrumentos PX aqui.

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